domingo, 31 de julho de 2011

GATOS E DOENÇAS CARDÍACAS


Dr. Moyses Fonseca Serpa,
CRMV-RJ 2016
Especializado em Cardiologia e Mestre em Ciência Veterinária mserpa@oi.com.br

É fato que o número de pessoas que criam e adoram gatos tem aumentado significativamente. Mas por ser uma tendência nova, esses novos proprietários de gatos pouco sabem sobre as doenças mais comuns nesses PET´s.
E evidentemente que isso se aplica às doenças cardíacas.
Ao contrário dos homens e de vários outros animais, esta espécie raramente apresenta os sinais clássicos de doença cardíaca, tipo: tosse, intolerância aos exercícios, ascite e edema pulmonar. Em virtude desta característica, na maioria das vezes, o doente quando é assistido já se encontra num estágio avançado da doença.
Então! Vamos conhecer um pouco mais sobre este assunto?
Doenças valvares
São bem frequentes nos cães pequenos, e são raras nos gatos. Nesta espécie as deformidades valvares congênitas como prolapsos; cordoalhas cruzadas, frouxas ou curtas; deformidades nos músculos que sustentam as cordoalhas; ausência de folheto valvar entre outras, são relatadas na literatura especializada. Mas, em face da precocidade e severidade das alterações – que são exuberantes e precoces – quase sempre a doença é fatal e o diagnóstico somente é realizado no pós-morte.
Nos gatos a forma crônica e degenerativa da doença valvar pode ser encontrada nos animais bem idosos, mas trata-se de uma esclerose como tantas outras observadas nos pacientes senis.
Doenças do músculo cardíaco
As cardiomiopatias podem ser primárias ou secundárias a outra doença e representam mais de 90% das doenças cardíacas dos gatos. Esta enfermidade é classificada em quatro grandes grupos em função de apresentação morfológica: A forma dilatada, a hipertrófica, a intermediária e a restritiva.
A apresentação dilatada de origem nutricional (por deficiência de Taurina) tornou-se muito rara com a presença deste aminoácido nas rações de boa qualidade. A forma dilatada mais observada é aquela secundária a administração de algumas drogas antineoplásicas no tratamento de determinados tipos de câncer.
Nesta apresentação, o coração perde progressivamente sua força de contração e os órgãos deixam de receber seus nutrientes e eliminar os resíduos orgânicos.
Na miocardiopatia restritiva o coração tem dificuldade para relaxar sua musculatura em face de uma fibrose cicatricial por doença virótica, inflamatória ou a uma doença imunológica. É com se houvesse uma “cinta restritiva” que reduz a capacidade de relaxamento do músculo.
A apresentação hipertrófica é a mais frequente – e a que mais preocupa. Pois o miocárdio fica espessado e enrijecido, o que diminui a câmara ventricular e consequentemente a capacidade do coração de receber o sangue oxigenado e levá-lo aos demais órgãos do corpo.
A miocardiopatia hipertrófica é secundária principalmente ao hipertiroidismo, a doença renal crônica e a hipertensão arterial – E pode ser evitada.
Na próxima visita ao médico do seu PET, converse com ele sobre a possibilidade de realizar alguns exames preventivos. ☼

O BRASIL NA CONTRA MÃO DO MUNDO


Vivi Vieri
Advogada

Em 1963, o Ministério da Saúde através do Decreto Nº 51.838, de 14 de Março de 1963, baixou normas técnicas para o combate da Leishmaniose destacando a importância das eutanásias de cães infectados e dirigindo ao Departamento Nacional de Endemias Rurais, por ser uma doença típica do meio rural.
Quarenta e oito anos depois, em pleno século XXI, na data de 11 de julho de 2008, dois Ministérios, da Saúde e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, baseados em decretos, entre eles o Decreto de 1963, resolveram criar a PORTARIA INTERMINISTERIAL Nº 1.426, adotando como primeira medida as eutanásias de cães infectados e proibindo o tratamento dos cães com medicações humanas em todo país.
Com o advento da nova Constituição, este Decreto de 1963 não foi recepcionado, havendo incompatibilidade entre ele e a norma constitucional de 1988, pelo fato de terem surgido novos direitos do cidadão, do animal, hoje considerado como sujeito de direito e do profissional, no caso em tela, o médico veterinário.
Como exemplo, a Portaria Interministerial, ao proibir o tratamento de cães infectados, obrigando o recolhimento para eutanasiar baseado apenas em um exame, está desrespeitando e ferindo o cidadão em seus direitos e sem fundamentos científico para isso, apenas embasados em revisões sistemáticas.
Portaria é ato administrativo, “que não pode inovar legislar, por que precisa se basear em leis, apenas regulamentando, dentro dos limites constitucionais e legais, o conteúdo da lei”.
Tais medidas encontram-se restritas ao âmbito de execução de atos normativos hierarquicamente superiores, sendo-lhes vedado inovar a ordem jurídica para restringir direitos ou impor obrigações.
Em um dos Informes Técnicos da OMS, diz: "o tratamento não é uma medida de controle de LV; não obstante, em situações especiais em que se aplique o tratamento, se recomenda que se apliquem medidas que impeçam o contato do cão tratado com o vetor de LV. Tais medidas deverão ser cientificamente avaliadas e validadas, com o objetivo de mitigar o risco de que o animal em tratamento seja fonte de infecção para o vetor e pessoas.
No Informe Técnico de 2010 do mesmo Instituto, fala-se do uso de medicamentos para controlar a doença e apesar de tantas informações contrárias e das evidências de que é um fracasso, a atual Portaria insiste nas eutanásias indiscriminadas, mantendo a mesma política, sendo o único país no mundo que controla a doença matando cães. O que falta são políticas públicas mais eficientes, não atribuir ao cão a responsabilidade pela disseminação da doença, haja vista ter outros reservatórios, entre eles o próprio homem e os problemas atuais como o crescimento urbano desenfreado.
Eutanásias obrigatórias são desnecessárias e carentes do devido respaldo científico. Descumpre as normas técnicas do Regulamento Sanitário Internacional, do qual o Brasil é signatário, desrespeita a Declaração Universal do Direito dos Animais, proclamada pela UNESCO em 1978, da qual o Brasil também é signatário, viola a Constituição Federal e demais leis protetivas da vida animal e desconsidera as orientações da OMS - Organização Mundial de Saúde
Nossa vizinha Argentina, adotou como medidas para controle de zoonoses, entre elas a Leishmaniose, um programa de guarda responsável, que inclui a castração de cães e gatos, medida esta recomendada pela OMS.
Com tantas evidências negativas, mesmo assim, o Brasil continua na contra mão do mundo, mantendo as mesmas diretrizes para o controle da Leishmaniose através do sacrifício sumário de cães supostamente doentes, desrespeitando os direitos do cidadão, todos esses direitos amparados pela nossa Carta Magna e lançando mão de uma política pública ultrapassada e ineficaz. ☼

A MORTE DO CÃO


Carlos Henrique Nery Costa
Médico


Há alguns dias, fui procurado pela TV para dar uma entrevista sobre calazar, relacionada
a uma declaração de uma funcionária da prefeitura de Teresina que a proporção de cães com teste positivo para a doença era muito elevada em alguns bairros, e que se havia notado um aumento do número de pessoas doentes na cidade nos últimos anos. Como sempre, expliquei os sinais da doença para que possíveis pacientes logo procurassem as unidades de saúde. Mas senti com um certo mal estar, pois havia cheiro de morte no ar. Passados uns dias, verifiquei que o mal estar era real quando soube do efeito da minha entrevista. No meu consultório, um paciente disse que graças à ela havia entregue o seu amado cão, completamente sem sintomas de doença, para ser morto pela prefeitura por ter um resultado de exame positivo.
Um cão saudável, belo, querido, morto por minhas palavras conduzidas por uma reportagem enganosa e por um ato de terrorismo de estado. Fiquei profundamente abalado. Gostaria de deixar claro que, enquanto eu era entrevistado, disse coisas que não foram publicadas. Por exemplo, alertei ao repórter que os meus anos de estudo de doença haviam me convencido que a matança de animais não reduz o risco para as pessoas e nem impediu a disseminação da doença pelo País afora e para a Argentina,
que não existem evidências científicas apoiando esta medida e que me oponho vigorosamente a ela. Nada impediram, no entanto, que o meu depoimento fosse editado de tal modo que a descrição dos sintomas servisse para aterrorizar as pessoas e induzi-las a entregarem os seus animais para a morte, para um sacrifício desnecessário. Para a TV, foi irrelevante o pensamento do entrevistado, desde que atendidos os interesses dos editores.
No ano passado, minha aluna Dra. Ivete Lopes de Mendonça defendeu sua tese de
doutoramento, que foi ao cerne do problema. Ela estudou cães destinados à morte. Fez testes para o diagnóstico e os comparou com o que encontrou nas vísceras dos animais. Notou que este mesmo teste que é utilizado pelo governo brasileiro é inútil para afirmar que um animal tem a doença. Por exemplo, se, em Teresina, a chance de um cão sem sintomas ter a doença for 10%, quando o teste dá um resultado positivo,
a chance de ter calazar passa apenas para 11% e, mesmo assim, todos são mortos! Ou seja, o teste não acrescenta informação relevante, o que faz com que, em circunstâncias similares, quase 90% dos cães mortos pelo Programa de Controle de Calazar sejam, na verdade, animais sadios.
Também no ano passado, foi publicada uma síntese do conhecimento sobre o assunto
encomendada pela Organização Panamericana de Saúde mostrando a ineficácia desta medida. Além disto, o Código Sanitário Internacional, do qual o Brasil é signatário, exige que toda medida de saúde pública deve ter evidências científicas em seu favor. Ainda assim, o Brasil, único no mundo, continua matando cães, induzido pela obsessão mortífera de funcionários públicos pouco esclarecidos e indiferentes às normas.
Este caso revela também outros fatos muito graves, que são as lições de ignorância e de
violência institucionais. Lição da irrelevância do conhecimento científico, de falsidades tomadas como verdades pela mídia oficializada, de indiferença às opiniões não oficiais e de banalização da morte, neste caso de seres inteligentes, sensíveis e amados. Assim, o Brasil comporta-se de forma primitiva e brutal, muito longe das características da nação civilizada e desenvolvida que, um dia, nós, brasileiros, almejamos ser.”